Quis o destino que o americano Glenn Greenwald estivesse vivendo aqui no Brasil, justamente nesse momento. Sua capacidade de fazer jornalismo é de fazer inveja a muitos dos conhecidos pseudo jornalistas que trabalham na imprensa tradicional brasileira. Completamente livre em suas publicações, Greenwald faz uma análise da situação política do Brasil sem estardalhaços, paixões ou partidarização.
Ele tem incomodado tanto a imprensa local com seus textos, que o jornaleco estadão, chegou a sugerir sua expulsão do país.
Para nós que admiramos o bom jornalismo e temos a certeza de que nomes como merval, reinaldo, sherazade, bonner, gentile, jabor, noblat, catanheda, entre outros, estão longe de serem considerados jornalistas, é sempre ótimo ler O Jornalista Glenn Greenwald.
Mais uma vez repito uma de suas frases que exprime muito bem a diferença entre um profissional de caráter e outros, que não são merecedores da nossa atenção. "Eu nunca disse que vou punir ninguém ou vou publicar por vingança. Vou publicar só
para mostrar ao mundo a informação que a população do mundo deve saber".
Abaixo seu último texto sobre a situação política do Brasil.
Texto de Glenn Greenwald - O Jornalista
extraído do DCM
extraído do DCM
O impeachment da presidente do Brasil democraticamente eleita, Dilma Rousseff, foi inicialmente conduzido por grandes protestos de cidadãos que
demandavam seu afastamento. Embora a mídia dominante do país
glorificasse incessantemente (e incitasse) estes protestos de figurino
verde-e-amarelo como um movimento orgânico de cidadania, surgiram,
recentemente, evidências de que os líderes dos protestos foram
secretamente pagos e financiados por partidos da oposição. Ainda assim,
não há dúvidas de que milhões de brasileiros participaram nas marchas
que reivindicavam a saída de Dilma, afirmando que eram motivados pela
indignação com a presidente e com a corrupção de seu partido.
Mas desde o início, havia inúmeras razões para duvidar desta história
e perceber que estes manifestantes, na verdade, não eram (em sua
maioria) opositores da corrupção, mas simplesmente dedicados a retirar
do poder o partido de centro-esquerda que ganhou quatro eleições
consecutivas. Como reportado pelos meios de mídia internacionais, pesquisas mostraram que
os manifestantes não eram representativos da sociedade brasileira mas,
ao invés disso, eram desproporcionalmente brancos e ricos: em outras
palavras, as mesmas pessoas que sempre odiaram e votaram contra o PT.
Como dito pelo The Guardian,
sobre o maior protesto no Rio: “a multidão era predominantemente
branca, de classe média e predisposta a apoiar a oposição”. Certamente,
muitos dos antigos apoiadores do PT se viraram contra Dilma – com boas razões –
e o próprio PT tem estado, de fato, cheio de corrupção. Mas os
protestos eram majoritariamente compostos pelos mesmos grupos que sempre
se opuseram ao PT.
É esse o motivo pelo qual uma foto – de uma família rica e branca num
protesto anti-Dilma seguida por sua babá de fim de semana negra,
vestida com o uniforme branco que muitos ricos no Brasil fazem seus
empregados usarem – se tornou viral: porque ela captura o que foram estes protestos.
E enquanto esses manifestantes corretamente denunciavam os escândalos
de corrupção no interior do PT – e há muitos deles – ignoravam
amplamente os políticos de direita que se afogavam em escândalos muitos
piores que as acusações contra Dilma.
Claramente, essas marchas não eram contra a corrupção, mas contra a
democracia: conduzidas por pessoas cujas visões políticas são
minoritárias e cujos políticos preferidos perdem quando as eleições
determinam quem comanda o Brasil. E, como pretendido, o novo governo
tenta agora impor uma agenda de austeridade e privatização que
jamais seria ratificado se a população tivesse sua voz ouvida (a
própria Dilma impôs medidas de austeridade depois de sua reeleição em
2014, após ter concorrido contra eles).
Depois das enormes notícias de ontem sobre o Brasil, as evidências de
que estes protestos foram uma farsa são agora irrefutáveis. Um
executivo do petróleo e ex-senador do partido conservador de oposição, o
PSDB, Sérgio Machado, declarou em seu acordo de delação premiada que
Michel Temer – presidente interino do Brasil que conspirou para remover
Dilma – exigiu R$1,5 milhões em propinas para
a campanha do candidato de seu partido à prefeitura de São Paulo (Temer
nega a informação). Isso vem se somar a vários outros escândalos de
corrupção nos quais Temer está envolvido, bem como sua inelegibilidade se candidatar a qualquer cargo (incluindo o que por ora ocupa) por 8 anos, imposta pelo TRE por conta de violações da lei sobre os gastos de campanha.
E tudo isso independentemente de como dois dos novos ministros de Temer foram forçados a renunciar depois
que gravações revelaram que eles estavam conspirando para barrar a
investigação na qual eram alvos, incluindo o que era seu ministro
anticorrupção e outro – Romero Jucá, um de seus aliados mais próximos em
Brasília – que agora foi acusado por Machado de receber milhões em subornos.
Em suma, a pessoa cujas elites brasileiras – em nome da “anticorrupção”
– instalaram para substituir a presidente democraticamente eleita está
sufocando entre diversos e esmagadores escândalos de corrupção.
Mas os efeitos da notícia bombástica de ontem foram muito além de
Temer, envolvendo inúmeros outros políticos que estiveram liderando a
luta pelo impeachment contra Dilma. Talvez o mais significante seja
Aécio Neves, o candidato de centro-direita do PSDB derrotado por Dilma
em 2014 e quem, como Senador, é um dos líderes entre os defensores do
impeachment. Machado alegou que Aécio – que também já havia estado envolvido em escândalos de corrupção – recebeu e controlou R$ 1 milhão em
doações ilegais de campanha. Descrever Aécio como figura central para a
visão política dos manifestantes é subestimar sua importância. Por
cerca de um ano, eles popularizaram a frase “Não é minha culpa: eu votei
no Aécio”; chegaram a fazer camisetas e adesivos que orgulhosamente
proclamavam isso:
Evidências de corrupção generalizada entre a classe política
brasileira – não só no PT mas muito além dele – continuam a surgir,
agora envolvendo aqueles que antidemocraticamente tomaram o poder em
nome do combate a ela. Mas desde o impeachment de Dilma, o movimento de
protestos desapareceu. Por alguma razão, o pessoal do “Vem Pra Rua” não
está mais nas ruas exigindo o impeachment de Temer, ou a remoção de
Aécio, ou a prisão de Jucá. Porque será? Para onde eles foram?
Podemos procurar, em vão, em seu website e sua página no Facebook por
qualquer denúncia, ou ainda organização de protestos, voltados para a
profunda e generalizada corrupção do governo “interino” ou qualquer dos
inúmeros políticos que não sejam da esquerda. Eles ainda estão
promovendo o que esperam que seja uma marcha massiva no dia 31 de julho,
mas que é focada no impeachment de Dilma, e não no de Temer ou de
qualquer líder da oposição cuja profunda corrupção já tenha sido
provada. Sua suposta indignação com a corrupção parece começar – e
terminar – com a Dilma e o PT.
Neste sentido, esse movimento é de fato representativo do próprio
impeachment: usou a corrupção como pretexto para os fins
antidemocráticos que logrou atingir. Para além de outras questões,
qualquer processo que resulte no empoderamento de alguém como Michel
Temer, Romero Jucá e Aécio Neves tem muitos objetivos: a luta contra a
corrupção nunca foi um deles.
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